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Covid-19: no enredo bolsonarista, a morte de milhares de pessoas é só uma estatística
Termômetro da Política
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Com aspirações ditatoriais, Bolsonaro usa briga com outros poderes para esconder incompetência do governo. Foto: Marcos Corrêa/PR

Pelo terceiro dia seguido, o Brasil superou a vergonhosa marca dos mil mortos. É, de longe, o líder do ranking diário de mortes no mundo, causadas pela pandemia do novo Coronavírus. Só nesta quinta-feira (28) foram 1.156 óbitos, elevando o país à triste marca de 26.754 mortes. E o pior é que para o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e seus apoiadores, está tudo bem e sobra tempo para comprar brigas com as instituições democráticas. Nesta semana, ele voltou a ameaçar o Supremo Tribunal Federal (STF).

O presidente, para encobrir a indisfarçável incompetência do seu governo, cria cortinas de fumaça para fugir das suas responsabilidades. Na prática, se apropria da frase atribuída ao líder comunista Josepf Stalin, buscando banalizar as milhares de mortes. E por que isso? Por que as pessoas sentem a perda de um ente querido, mas quando o número sobe aos milhares, o impacto é diluído. Era a linha defendida por Stalin, de que “a morte de uma pessoa é uma tragédia; a de milhões, uma estatística”.

E nesse ponto, o da estatística, o governo bolsonarista anda muito, muito mal. E não precisa muito para enxergar isso. Basta dois neurônios e um pouco de caráter. Até por que no núcleo duro do governo tem sempre alguém disposto ao negacionismo. No dia 15 deste mês, o ministro Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) criticou o clima de terror com as mortes registradas. Naquele dia, o país já beirava as 15 mil mortes. E o que fez o general/ministro? Comparou os números de mortes causadas pela pandemia com acidentes de trânsito.

“Todo mundo aqui deve andar de carro ou de ônibus, pratica esporte. A média de mortes por ano de queda, afogamento, acidente automobilístico, lesões provocadas de toda ordem: 164 mil mortes. Os números são impactantes, mas nem por isso é instaurado um clima de terror”, afirmou. O comentário análogo ao terraplanismo segue a linha do que vem sendo constantemente defendido pelo chefe.

Não faz muito, Bolsonaro desdenhou da dor de quem tem perdido parentes e amigos. Ao ser questionado sobre as mortes, no dia 1 deste mês, cunhou mais uma pérola das muitas lançadas ao gado. “E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre”, disse, lavando as mãos para a situação do país. Naquele momento, o governo já havia perdido um ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. O substituto, Nelson Teich, que nunca conseguiu explicar o que foi fazer no governo, pediu demissão dias depois.

Desde que a crise surgiu, com a escalada de mortes, o presidente não fez outra coisa a não ser atrapalhar e puxar briga com os outros poderes. O triplo carpado hermenêutico discursivo tem desviado as atenções, mas é difícil dizer que essa letargia cognitiva da população será mantida no mesmo patamar quando passarmos a marca dos 100 mil mortos. E o caminho está aberto para isso. Haverá o momento em que até o gado vai entender que a morte de milhares também é uma tragédia.

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