Assistente Social no SUS. Professora de Serviço Social. Doutoranda em Serviço Social pela PUC/SP.
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Brasil lidera mortes de profissionais de saúde por covid-19 no mundo
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Foto Marco Antonio Rezende/PMRJ/Fotos Publicas

A pandemia da Covid-19 tem trazido números tristes para todo o mundo, infelizmente os dados são assustadores e não há motivo para celebrações. O Brasil, que enfrenta a pandemia de forma mais aguda desde 16 de março de 2020, já lidera o ranking mundial de mortes de profissionais de saúde que atuavam na linha de frente. Se levarmos em consideração a subnotificação e falta de testagem em massa, esses dados podem ser ainda mais graves.

Portanto, podemos considerar que apesar do novo coronavírus ter entrado através de aeroportos ele se reproduz principalmente através do trabalho, sendo assim também uma doença do trabalho, afetando também profissionais de saúde. Estamos falando de trabalhadores da saúde das mais diversas áreas: profissionais de medicina, enfermagem (inclusive técnicos), assistentes sociais, psicologia, limpeza, apoio, maqueiros, administrativo, técnicos em radiologia, laboratório e outros.

Infelizmente no processo de coleta de informações, depara-se com falta de dados precisos. No site do Ministério da Saúde, por exemplo, não há nenhum dado que especifique os casos de Covid-19 por profissionais de saúde.

Entre as maiores dificuldades dos trabalhadores da saúde, estão: falta de treinamento para manejo clínico da doença e bem como para uso correto de Equipamentos de Proteção Individuais (EPIs) (paramentação e desparamentação), seja de máscara, viseira, capote, macacão, luvas e afins. Ainda há o problema da escassez/limitação de EPIs, afinal, não basta o acesso é preciso quantidade necessária para a troca em tempo correto, conforme nível de exposição às secreções e aerossóis.

Somado a isso, a maioria dos profissionais de saúde ainda não recebem insalubridade e periculosidade justas para a atuação e exposição frente ao novo coronavírus e uma parcela sequer recebe qualquer vantagem pela atuação na saúde e exposição às doenças infectocontagiosas. Outros tantos profissionais mesmo sendo do grupo de risco também não conseguem afastamento do trabalho, muitas vezes pela precariedade do vínculo.

Outro grave problema que ainda cerca os profissionais de saúde é a falta de testes. Essa situação afeta todo a população do Brasil e em especial profissionais de saúde. Recentemente o COFEN recorreu ao Tribunal Regional Federal para garantir o direito de testagem para profissionais de enfermagem mesmo sem sintomas clínicos.

Conforme pesquisa de O Globo (21/05), 113 médicos morreram vítimas da doença. Conforme O Globo. “O Rio é o estado com o maior número de vítimas no período: 30 médicos perderam a batalha contra a Covid-19. O Pará, com 27, e São Paulo, com 26, aparecem logo em seguida no ranking. Há ainda casos em Pernambuco (6), Amazonas, Minas e Paraíba (4 cada), Ceará e Rio Grande do Norte (3 cada), Paraná e Bahia (2 cada), além de Alagoas e Santa Catarina (1 cada).”

Infelizmente, não há dados atualizados sobre a situação. Os dados mais confiáveis são da enfermagem, que através do Conselho Federal da Enfermagem (COFEN) construiu um observatório da COVID-19 da categoria. Conforme os dados deste observatório, 18.354 mil enfermeiros e técnicos de enfermagem foram infectados, destes, 182 foram a óbito. Sendo assim a categoria mais atingida pela pandemia da covid-19 no Brasil e no mundo em números absolutos.

O estado de São Paulo lidera com 39 óbitos, seguido do Rio de Janeiro com 36 óbitos, Pernambuco (26), Amapá (16), Amazonas (11), Ceará (10), Pará (8), Maranhão (6), Paraíba e Rondônia (4), Acre, Bahia, e Santa Catarina (3 cada), Distrito Federal, Mato Grosso e Minas Gerais (2 cada ), Alagoas, Goiás, Paraná, Roraima, Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul (1 cada). Demais estados não registraram óbitos.

Em conversa com Fabiana Rodrigues, enfermeira intensivista em uma unidade de pronto atendimento de urgência e emergência, ela relatou sobre o trabalho na linha de frente da pandemia da covid-19.

Acesso aos EPIs

Tem ocorrido de forma tranquila, mas com o acesso limitado. Tem ocorrido a estratégia de redução de carga horária para economia de uso de EPI, onde os profissionais ficam seis horas com paramentação completa sem poder ia ao banheiro, por exemplo. O acesso às máscaras cirúrgicas é limitado, são disponibilizadas três por plantão.

Treinamento

Em um primeiro momento não teve treinamento, ficou a cargo de cada profissional buscar a correta forma de paramentação e desparamentação.  

Carga Horária

Não teve aumento de carga horária em si, mas com alguns afastamentos de profissionais sintomáticos ou mesmo infectados, alguns profissionais precisaram dar plantões extras para que plantões não ficassem descobertos. De todo modo, o trabalho está mais intenso nas horas trabalhadas, os profissionais de enfermagem estão acumulando novas funções por estarem mais expostos na área “contaminada”, acumulando assistência, auxílio na regulação, apoio à farmácia, apoio ao laboratório e aos demais funcionários que sentem medo de entrar na área de internação (“contaminada”), colocando e delegando para a enfermagem essas atribuições para além das quais já realizam.

Fiscalização das condições de trabalho

Segundo a enfermeira Fabiana, durante este período de pandemia da covid-19, nunca recebeu nenhum tipo de fiscalização sobre as condições de exercício do trabalho de nenhuma instituição, seja conselho, seja sindicato ou ministério público.

Adoecimento, medo e vida social

Desde março que Fabiana não tem contato direto com a mãe, idosa e hipertensa, portanto, do grupo de risco. Para vê-la, traçou estratégias concentrando os plantões no início do mês de maio e outros nos fins de junho para poder criar uma janela imunológica e poder vê-la ao menos um dia.

A ansiedade se faz presente na vida de profissionais de saúde, o medo de ser infectado atormenta àqueles que estão na linha de frente. Fabiana acrescenta que além de ser enfermeira é docente, e somado ao trabalho de assistência direta ainda acumula com o trabalho de formação profissional de enfermeiros/as numa nova lógica de ensino à distância neste “novo normal” que a pandemia vem forçando.

Observa-se que apesar do nível de exposição do profissional à uma possível contaminação, o maior desafio é como antecipar possível situações de adoecimento e sofrimento mental, sendo estas também questões de saúde pública e um dos principais motivos de afastamentos de trabalhadores de saúde de seu trabalho. Nenhuma política ou programa vem sendo realizado de forma sistemática pelo Sistema Único de Saúde, ficando a cargo de cada município ou estado buscar tratar a situação como bem entender ou priorizar.

O trabalho intenso e o enfrentando de condições adversas podem agravar sintomas de ansiedade, depressão, irritabilidade, transtorno de estresse agudo e síndrome de burnout, o que mais uma vez coloca a importância de pensar a pandemia da Covid-19 em vários aspectos como doença do trabalho.

O site do COFEN, por exemplo, oferece atendimento exclusivo ao apoio à Saúde Mental de Profissionais de Enfermagem que estão na linha de frente da Covid-19 mediante o preenchimento de formulário em um bate-papo. O mesmo serviço não foi encontrado em nenhum outro site de órgão profissional ou do Ministério da Saúde.

Contudo, o Ministério da Saúde informou em abril que destinaria 2,3 milhões de recursos para suporte psicológico de profissionais do SUS mediante um canal de teleconsulta. Esse canal telefônico que seria disponibilizado em maio não foi divulgado até a presente data.

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