Tinha tudo para ser mais um Clássico Tradição com todo o peso que as duas camisas representam para o futebol da Paraíba. Veio uma pandemia, o estado de calamidade decretado, a pausa no Campeonato Paraibano e, na volta, uma nova realidade cheia de protocolos, sem público, sem a energia que vem da arquibancada. Sob condições extremas, seguimos conscientes de que este retorno pode ser chamado de tudo, mas jamais será um “novo normal”.
Apesar da vantagem de dois gols do Botafogo-PB sobre o Treze e da suposta superioridade do time da capital, que vinha de campanha invicta, a partida de volta pela semifinal do estadual teve muita disputa fora de campo. Uma semana inteira de provocações envolvendo jogadores e torcida. Teve salto alto da turma do Belo, em clima de “já ganhou”, assim como teve marra dos trezeanos.
Fora das quatro linhas, a pausa no futebol devido à pandemia causada pela covid-19 destacou dois personagens: Breno Calixto, pelo Treze, e Léo Moura, pelo Botafogo-PB.
Do lado do Galo, o zagueirão e capitão do time garantia desde a derrota em João Pessoa que nada estava perdido. Também conhecido por sua participação ativa nas redes sociais digitais, Breno Calixto foi provocado por torcedores do tricolor da capital durante a semana inteira. Diziam que o zagueiro era “só mídia”. Teve torcedor dando risada e soltando pilhéria nos perfis do atleta.
Pelo Belo, Léo Moura era o retrato da ausência. Foi contratado para ser referência dentro e fora de campo. Uma grande jogada de marketing da diretoria ao apostar em um jogador da elite do futebol brasileiro, mas que na Paraíba não justificou o valor do investimento, considerado como a maior contratação da história do futebol Paraibano.
Além da rivalidade entre seus times, outro ponto extracampo coloca os dois jogadores em posições completamente opostas: o posicionamento político. Enquanto Breno Calixto tem postura antifascista declarada, Léo Moura já fez referência positiva ao presidente Jair Bolsonaro, o que lhe rendeu críticas da torcida.
Com Léo Moura fora da disputa, Breno Calixto virou foco.
É verdade que em outro momento a ala progressista da torcida do Belo chegou a tirar o chapéu para o zagueiro do Galo. Mas como em mata-mata não tem isso de elogiar adversário, os botafoguenses da capital foram na canela. Um dia antes da partida de volta, viralizou o trecho cortado em dez segundos de um vídeo onde Breno pedia que os torcedores não ouvissem fofoca. Segundo o atleta, a fala fazia parte de uma explicação maior. No trecho cortado ele foi infeliz, classificou Campina Grande como cidade “pequena e fofoqueira”.
Excluindo a torcida, os demais elementos para um grande clássico estavam em campo. Teve provocação durante a semana, teve muita marra, e teve entrega dentro de campo, mas só do lado do Treze, que não desistiu e ficou com a vaga para disputar uma final grandiosa contra seu maior rival. Um Clássico dos Maiorais como nunca se viu, literalmente.
Em tempos normais, futebol já não era só futebol. É cotidiano. É afeto. É fato social complexo demais para ser tratado somente como esporte. Uma conjuntura cultural, quase religiosa, que faz parte, com maior ou menor intensidade, da vida de todo brasileiro. Na partida que começou há uma semana e culminou com a decisão e quarta-feira à noite, Botafogo-PB e Treze mostraram muito mais do que futebol. Foi pandemia, futebol, mídia e política.
Texto publicado na edição de 7.8.2020 do jornal A União