Jornalista, fotógrafo e consultor. Mestre em Computação, Comunicação e Artes pela UFPB. Escreve desde poemas a ensaios sobre política. É editor no Termômetro da Política e autor do livro infantil "O burrinho e a troca dos brinquedos". Twitter: @gesteira.
Jornalista, fotógrafo e consultor. Mestre em Computação, Comunicação e Artes pela UFPB. Escreve desde poemas a ensaios sobre política. É editor no Termômetro da Política e autor do livro infantil "O burrinho e a troca dos brinquedos". Twitter: @gesteira.
A morte e a morte de Ricardo Coutinho: fim do Ricardismo na PB
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Série de fatores decretou a morte de Ricardo Coutinho na política (Foto: Reprodução/Instagram)
Série de fatores decretou a morte de Ricardo Coutinho na política (Foto: Reprodução/Instagram)

Estava praticamente decretada a morte de Ricardo Coutinho na política. Foi melancólico o fim do ex-governador nas eleições de 2020. Apesar de ser reconhecido como o melhor prefeito que a cidade de João Pessoa já teve, não conseguiu sequer ir para o segundo turno na disputa com outros 13 candidatos. Dono de uma trajetória política vitoriosa, foi incapaz de construir um legado político, apesar de tantas conquistas sociais. Hoje, o império construído pelos girassóis na Paraíba se desmancha no ar, e os poucos que ainda mantêm seus mandatos precisam abrir o olho para não serem também expurgados nas próximas eleições. 

Pode-se dizer que a primeira ruína do Ricardismo foi de morte “matada”. A morte de Ricardo Coutinho foi conduzida por um sistema que se apropriou do mesmo modus operandi do lavajatismo. Os paladinos da moral trabalharam para impor na Paraíba uma narrativa que persegue seus alvos por meio de subterfúgios supostamente legais, sempre respaldados pela imprensa. 

A prática lançada pela Lava Jato esquece que a lei no Brasil beneficia o réu, e cabe a quem acusa o ônus da prova. Esse modelo respeita os direitos humanos e protege cidadãos de bem contra ditaduras e governos autoritários. A liberdade para se defender de uma acusação diante de um tribunal neutro é base sólida no Estado Democrático de Direito. 

Leia também: Anderson Pires analisa conjuntura política no segundo turno em João Pessoa

Acusaram Ricardo de ter roubado uma quantia milionária sem que fosse apontado onde estava esse dinheiro. Impuseram a Ricardo uma prisão preventiva sem que ele apresentasse qualquer risco à sociedade. Colocaram no cidadão Ricardo Coutinho uma tornozeleira eletrônica para impedir que ele fugisse, medida que só deve ser adotada contra acusados que podem fugir e impedir o curso das investigações. Contra Ricardo, que tem endereço fixo e se dispôs a colaborar, a tornozeleira eletrônica foi puro exercício de poder para satisfazer o ego de quem pediu sua aplicação. 

E assim se desconstruiu a imagem do homem que até então era tido como trabalhador. Todos esses passos, claro, aconteceram tendo a imprensa como partícipe dos atos, sempre trazendo em primeira mão, às vezes nas primeiras horas da manhã, como se a disputa por acessos valesse mais do que preservar a verdade, nem que para isso reputações fossem destruídas. 

Ficou difícil enfrentar uma eleição após um trabalho tão sistemático para aniquilar politicamente qualquer resquício da força que Ricardo tivera outrora. Além da forma inquisitória como foram perseguidos Ricardo e seus aliados, era evidente a fragilidade das peças acusatórias e da ausência de provas contundentes. O que virou escândalo em plena campanha foi a reportagem da Carta Capital que aponta suspeita de manipulação de provas por parte do Ministério Público da Paraíba. Se for verdade, teremos aqui um processo tão vil que sequer Kafka, em sua ficção, seria capaz de prever. Uma reprodução da prática tão usada na ditadura militar, quando o policial ‘plantava’ um saquinho de cocaína no bolso do jovem inocente para prendê-lo como traficante.

Mas atribuir a derrota de Ricardo nas urnas somente aos seus problemas com o Ministério Público é referendar o discurso da vítima e assinar embaixo a tese única da perseguição. Ricardo foi, sim, sistematicamente perseguido. Até uma derrota no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ele sofreu na reta final do primeiro turno, sem que alterasse em nada sua candidatura, mas suficiente para jogar a última pá de terra sobre sua cova. No entanto, não foi somente pela questão jurídica que o Ricardismo morreu. 

Campanha foi segunda morte de Ricardo Coutinho

A outra morte de Ricardo Coutinho se deu em plena campanha eleitoral. Nilvan Ferreira (MDB) ficou com a segunda colocação no primeiro turno em João Pessoa com 16,61% dos votos. 

Bastava isso para Ricardo. 

Portanto, no primeiro turno, ele não precisava alcançar a maioria dos eleitores. 

Era sua a maior candidatura identificada à esquerda, tinha um caminho fácil para conseguir o suficiente. Ganharia a eleição ao final? Jamais saberemos. Segundo turno é outra campanha. 

Ricardo usou seu tempo de campanha para dizer que foi bom gestor e lembrar à população suas obras enquanto prefeito de João Pessoa. 

Ninguém tem dúvidas de que Ricardo tenha sido um bom gestor.

O que faltou  foi enfrentamento. Para chegar ao segundo turno, Ricardo precisava ter elevado o tom contra seus acusadores, cobrado que mostrassem as provas e se posicionado mais à esquerda. 

O eleitor de Ricardo estava acabrunhado no início da campanha diante de tamanha violência praticada contra a imagem do político ao longo dos últimos meses. E o que este eleitor mais esperava era aquele Ricardo galo cego, que ia pra cima sem dever nada a ninguém. Além da imagem de trabalhador, outra cristalizada no eleitorado girassol era a da coragem. De tanto aliviar o tom, Ricardo virou ‘paz e amor’. Foi buscar no centro, nos moderados e até nos evangélicos o voto que só precisaria depois de iniciado o segundo turno. Disputou entre conservadores, perdeu mais do que ganhou. 

Ricardo não está morto. Pode ressurgir após o período de inelegibilidade. Pode ainda provar sua inocência, ou ser condenado. Aconteça o que acontecer, o Ricardismo morreu em João Pessoa. Não sobrou sequer um vereador para contar história.  

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