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Leis de apoio aos autistas têm que sair do papel, dizem debatedores
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Em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado Federal, nessa quarta-feira (21), debatedores lamentaram a precariedade do atendimento às pessoas autistas, cobraram a conscientização da sociedade e do governo sobre esse segmento da população e ressaltaram que as leis de apoio devem ser cumpridas. A audiência foi promovida em atendimento a requerimento do presidente da CDH, senador Flávio Arns (PSB-PR), para marcar o Dia Mundial do Orgulho Autista, celebrado em 18 de junho.

Na abertura da audiência, Arns citou pesquisa realizada pelo Senado com instituições, famílias e profissionais especializados sobre os desafios enfrentados pelas pessoas com transtorno do espectro autista em aspectos como acesso a medicamentos e terapias, programas assistenciais e inserção no mundo do trabalho. A pesquisa concluiu que, em geral, a legislação já atende a esses aspectos.

“O importante, segundo o estudo realizado, é transformar os direitos em realidade, tirar os direitos do papel e levá-los à vida diária”, sublinhou Arns.

O diretor-presidente do Movimento Orgulho Autista Brasil (Moab), Edilson Barbosa, reforçou a importância da implementação de políticas públicas na União, estados e municípios e destacou a necessidade de o Brasil saber lidar melhor com o transtorno do espectro autista. Conforme ressaltou, é uma situação que pode ocorrer em qualquer família. Ele comemorou a Lei 12.764, de 2012, que “mudou a vida do autista e das famílias” ao considerar o autista como uma pessoa com deficiência, e a Lei 13.977, de 2020, que institui a carteira de identificação da pessoa com transtorno do espectro autista.

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“Queremos que a população entenda: quando uma pessoa autista estiver numa fila de prioridade, não é por ser uma pessoa idosa, uma mulher grávida ou uma mulher com uma criança: ele ou ela, sendo autista, tem direito também, e a gente vai aprendendo”.

Barbosa cobrou organização dos governos para que, desde o primeiro dia de aula, haja um monitor ou uma pessoa para acompanhar os alunos autistas, de modo que esses alunos não percam tempo de estudo. Ele disse que o Sistema Único de Saúde (SUS) precisa ter políticas mais focadas no setor e ser mais eficiente na emissão de laudos para que autistas tenham acesso a seus direitos.

Acesso a tratamento

Erika Karine Rocha Dallavechia, fundadora-presidente do Projeto Social Angelina Luz, lamentou o grande número de autistas que nunca tiveram acesso a tratamentos e terapias. Para ela, a luta pelos direitos dos autistas é a busca pelos direitos constitucionais de saúde e educação, que deveriam ser universais.

“Não estamos falando de “deficiência”, mas falamos primeiramente de seres humanos que estão sendo negligenciados”, protestou.

Em sua avaliação, os pais de muitos autistas vivem em “estado de luto”; os autistas enfrentam a inexistência de uma rede de apoio, muitas vezes estão expostos a agressões nas escolas, e suas mães ficam sobrecarregadas.

Presidente da Associação Brasileira de Neurodiversidade e do Coletivo Autistas Adultos Brasil, Ana Lecticia Soares Muller Lobo Rezende teve diagnóstico tardio de autismo, aos 40 anos, e enfrentou situações de abuso psicológico. Ela citou a dificuldade de dar voz aos autistas adultos porque persiste o pressuposto de deficiência intelectual desse segmento. Segundo Ana Lectícia, mesmo por meios alternativos de comunicação, todo autista tem a capacidade de falar em seu próprio nome.

“A gente tem o direito de existir. É um direito básico de qualquer ser humano. Não interessa se eu sou neurodiversa, não interessa se minha condição é genética, se eu nasci assim: eu não tenho como mudar como eu sou”, definiu.

Falta de recursos

Coordenadora-geral do Centro Educacional da Audição e Linguagem (Ceal) Ludovico Pavoni, Maria Inês Correia Serra Vieira criticou os baixos valores repassados pela União e pelo Distrito Federal para os atendimentos, que levam a entidade a operar com déficit, mas reiterou que o foco deve ser no trabalho sério e na qualidade no atendimento desde a primeira infância. O Ceal é uma instituição privada de interesse público sediada em Brasília que atende crianças e adolescentes com deficiência auditiva e intelectual.

“Ao longo de dois ou três anos, a gente já percebe uma criança com comportamento muitíssimo modificado, respeitadas as suas individualidades e características. Crianças que não falavam e que passam a falar, crianças que colaboram e participam das atividades e passam a pertencer aos grupos de interação social”.

Edilson Barbosa, que teve um filho atendido pelo Ceal, manifestou apoio às entidades que estão suprindo o papel do Estado, muitas vezes com pouco ou nenhum apoio oficial, e que sofrem com limitações de pessoal e infraestrutura. Ele pediu atenção dos gestores públicos para o cumprimento da lei.

“Onde há políticas públicas interessantes, potencializá-las será bom até para o Estado. Precisamos disso: valorizar e acreditar”.

Erika Karine Dallavechia também citou outras instituições sociais que atendem o autismo e que merecem a “mão estendida” do Estado.

Carga laboral

O encerramento da audiência foi marcado pelo protesto de uma servidora terceirizada do Senado, mãe de autista, que não tem direito à redução de carga laboral para acompanhar o filho à terapia. Edilson Barbosa lembrou que os servidores públicos da União e de alguns estados já têm esse direito, mas não os terceirizados, regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

“Está na hora de o Brasil olhar o rosto daquela mãe. A gente precisa alterar a CLT, e as empresas precisam ser sociais também”.

Flávio Arns, por sua vez, pediu providências para o encaminhamento do assunto pela CDH de forma “adequada e urgente”.

Fonte: Agência Senado

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