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Seis anos depois da agressão, advogada vítima de violência doméstica celebra ter deixado de “morrer aos poucos”
Laura de Andrade*
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A cada 24 horas, pelo menos oito mulheres são vítimas de violência doméstica. É o que apontam os dados do boletim Elas Vivem: Liberdade de Ser e Viver, divulgado em março deste ano. Você já parou para pensar como elas seguem a vida após os casos? A advogada Myriam Gadelha escreveu um texto na rede social digital Instagram nessa quarta-feira (10) sobre o assunto, um dia depois que foi mantida, pela Justiça, a condenação do atual prefeito de Sousa, Fabio Tyrone (PSB), por agredi-la. “Seis anos depois, eu vivo a tamborilar na ideia de quem eu seria hoje, caso não tivesse sido agredida. Talvez a mesma mulher de 2018, talvez uma versão melhor dela”, publicou.

Myriam afirma que foi agredida momentos após esta foto, quando chegou em casa (Foto: Reprodução/Instagram)

O agente político foi condenado a um ano e quatro meses de prisão, em regime aberto, por agredir Myriam fisicamente no ano de 2018. Na terça-feira (9), a Câmara Criminal do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB) rejeitou por unanimidade o recurso movido pela defesa de Tyrone. O caso está sendo julgado no Juizado de Violência Doméstica da Comarca de João Pessoa.

De acordo com o art. 5º da Lei Maria da Penha, violência doméstica e familiar contra a mulher é “qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”.

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Confira o texto completo: 

Uma amiga me mandou esse vídeo ontem: ‘My, lembra desse dia? Foi pouco antes de você apanhar’. Não lembrava, assim como lembro pouco dessa mulher que aparece nele. Eu era outra pessoa, em quase tudo. Mais leve, mais alegre, mais aberta. Também era mais ingênua, via maldade em quase nada. Seis anos depois, eu vivo a tamborilar na ideia de quem eu seria hoje, caso não tivesse sido agredida. Talvez a mesma mulher de 2018, talvez uma versão melhor dela. Fui me virando como deu, juntando pedaços, sentindo medo, perdendo e recuperando desejos como uma garimpeira. Eu nem queria falar sobre isso, porque sinto que quase tudo está dito. Por enquanto, a justiça está feita. 

Como mulher e advogada, estou aliviada e feliz. Mas eu sou só uma mulher – uma que é advogada, instruída, com uma boa rede de apoio. Paguei meu advogado com camisa, gravata e uma amizade de 15 anos. O melhor advogado que se pode pagar na cidade. Tive ombro e colo, muita gente que acreditou e me apoiou. Mesmo com tudo isso, morri um pouco. Sei que muitas mulheres morrem disso todos os dias, morrem porque homens matam, e as que não morrem logo, vão, como eu, morrendo aos poucos. A imensa maioria, não tem rede de apoio, advogado bom de graça, não é advogada, não tem metade dos meus privilégios para enfrentar engrenagens tão machistas. 

Por isso, escolho falar e escrever, porque é preciso. Infelizmente, essa história não é só minha; infelizmente, perdemos mais que ganhamos; infelizmente, mesmo acusando, é preciso também nos defender. Tudo muito arcaico, senil, primitivo, daquelas coisas que só quem viveu, sabe. Hoje, tendo deixado de ‘morrer aos poucos’, sinto que podemos, um dia, começar a ganhar todos os dias. 

Por essa redenção, agradeço, especialmente, ao meu irmão, @lafayettegadelha , ao meu advogado, @iarleymaia e a tantos outros que ajudaram (@diego_caze , @giovannasmuniz , @janaynanunes.advogada e @eduardo_acavalcanti), às minhas irmãs, primas e amigas que nunca, em nenhum dia, deixaram de acreditar que tudo ia, eventualmente, dar certo. 

Honro o pouco que há a ser celebrado e saúdo o muito que há de vir a ser comemorado, porque sei que mais gente se juntará a nós, afinal, ‘sou porque somos’.


*Sob supervisão de Felipe Gesteira

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