Jornalista, fotógrafo e consultor. Mestre em Computação, Comunicação e Artes pela UFPB. Escreve desde poemas a ensaios sobre política. É editor no Termômetro da Política e autor do livro infantil "O burrinho e a troca dos brinquedos". Twitter: @gesteira.
Jornalista, fotógrafo e consultor. Mestre em Computação, Comunicação e Artes pela UFPB. Escreve desde poemas a ensaios sobre política. É editor no Termômetro da Política e autor do livro infantil "O burrinho e a troca dos brinquedos". Twitter: @gesteira.
Oportunismo sobre a morte
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Bosquinho (Foto: Olenildo Nascimento/CMJP)

O que seria um dia de festa em celebração ao esporte na capital paraibana terminou em clima de luto. A morte do empresário José da Silva Nogueira Neto, de 48 anos, a 100 metros da linha de chegada da Meia Maratona de João Pessoa no último domingo (16), deixou a cidade em choque. Mesmo quem não participou da prova sentiu a perda do corredor. Ali estava alguém que buscava superar mais um desafio pessoal, tinha a corrida de rua como hábito e defendia uma vida ativa e saudável. 

São diversos os motivos para se participar de provas como uma meia maratona. Tem corredor ali buscando vencer desafios, uns porque a corrida ajuda a enfrentar seus demônios pessoais, muitos pela saúde, outros tantos por marcas pessoais. Tem quem vai para se exibir, para brincar, e até aqueles que apenas colam na modinha, porque os amigos vão e isso basta como um bom motivo. Não sei qual era o de José da Silva Nogueira Neto, que já havia até participado de uma maratona inteira. Também não sei do seu preparo físico recente, se estava apto, se o corpo mandou sinais durante a prova e ele encarou como um limite a ser superado. Não vejo os pontos sobre o corredor falecido como válidos para discussão. Neste momento de dor, presto minha solidariedade à família. 

Enquanto um círculo prontamente se formou em torno dele para vibrar positivamente, diversas pessoas passavam ao lado de um corpo no chão, concentradas apenas em terminar seu percurso, como se nada mais existisse. Respeito o atleta de alto rendimento que precisa chegar o quanto antes pois do resultado depende sua profissão. Não é deste profissional que estou falando. Àquela altura, quem passava por ali já não ia mesmo pegar pódio. O tempo de quem não vai mesmo vencer a corrida serve apenas para alimentar egos, pois tanto faz terminar na 48ª ou na 127ª posição, o prêmio vai ser a mesma medalha, um copo de água e uma banana. Claro que há uma disputa contra si, mas esta pode ser travada outro dia. O corpo no chão põe a humanidade de quem passa ao lado à prova.

Sei que já se passaram alguns dias, mas a imagem não sai da cabeça de quem corre. Mexeu com os corredores, com as famílias. Minha esposa não quer que eu participe mais de nenhuma meia maratona. Eu quero participar, e nisso se instala um clima de apreensão. Durante a semana o tema foi amplamente debatido em João Pessoa, e na Câmara Municipal, aproveitando o ‘gancho’ midiático, um Projeto de Lei que tramitava desde abril deste ano foi aprovado, sob o calor da emoção pela morte de Nogueira Neto. De autoria do vereador Bosquinho (PV), a lei torna “obrigatória, no âmbito do município de João Pessoa, a apresentação de declaração de aptidão de saúde, emitida por profissional médico, para inscrição e participação em eventos de corrida de rua, de caráter competitivo ou participativo”. 

É lamentável que um parlamentar gaste energia e recursos públicos com um projeto absolutamente inexequível. É totalmente inviável cobrar que cada participante de um evento desportivo faça uma consulta médica para poder se inscrever. De tão burocrático, seria um desincentivo à prática esportiva. Vale ressaltar que no momento da inscrição, o participante declara estar apto e assume toda a responsabilidade sobre sua integridade física, restando à organização do evento a garantia de suporte com ambulâncias e equipes médicas de prontidão. 

O projeto de lei apresentado pelo vereador Bosquinho foi no mínimo oportunista, para não dizer desrespeitoso. Uma pena também que os demais parlamentares tenham entrado na onda e aprovado o projeto. A tendência é de veto pelo Executivo Municipal.

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