Bióloga, mestre em Modelagem Computacional e Doutora em Ciência da Computação. Atualmente é professora quase associada da UFPB. Tem experiência na área de Bioinformática, Inteligência Artificial e suas aplicações. Além disso, coleciona livros, Legos, viagens, plantas, receitas e amigos.
Bióloga, mestre em Modelagem Computacional e Doutora em Ciência da Computação. Atualmente é professora quase associada da UFPB. Tem experiência na área de Bioinformática, Inteligência Artificial e suas aplicações. Além disso, coleciona livros, Legos, viagens, plantas, receitas e amigos.
ads
As máquinas estão se tornando cada vez mais humanas ou nós somos cada vez mais padrões?
Compartilhe:
Cena do filme Tubarão (1975) – (Foto: Divulgação/Universal City Studios)

As máquinas aprendem e tornam-se inteligentes a partir da experiência passada para elas. Daí, passam a reconhecer padrões e produzir ações. São 4 as formas possíveis de utilizar a aprendizagem de máquina. Na supervisionada, como o nome de forma óbvia já indica, um supervisor apresenta a experiência através de suas sensações e atuações. É como se você explicasse para a máquina as características de um animal e que animal é esse, ou explicasse para a máquina índices de cidades e também seus PIBs. Percebe-se que assim, explicamos os dados de entrada e saída, de forma que com novas entradas, até então desconhecidas à máquina, a partir de um padrão entendido com casos anteriores, prevê-se a saída associada ao dado de entrada novo.

Na não supervisionada, essa saída não é conhecida, assim, a máquina tem como tarefa entender padrões a partir de similaridades e dissimilaridades dos objetos. Ela nunca será capaz de saber quem é Brad Pitt, mas será capaz de agrupar milhares de fotos de Brad Pitt e deixar de fora desse grupo as fotos de seu melhor amigo George Clooney. Em um exemplo onde apresento à máquina apenas fotos de Gisele Bundchen e Natalie Portman, quem a máquina dirá que é, recebendo uma foto minha??? É a chance de virar uma supermodelo brasileira, uma atriz israelense graduada em Havard ou não ser ninguém?!?

Existe ainda uma mistura das duas técnicas anteriores, a aprendizagem semi supervisionada, onde agrupam-se instâncias e, a partir das poucas já rotuladas, expande-se o rótulo para as demais que compartilham o mesmo grupo. Em um mundo com cada vez mais dados e cada vez menos rótulos (?), é um dos métodos que vem sendo cada vez mais usado.

Por fim, um dos mais novos métodos, a aprendizagem por reforço, ensina-se à máquina o que pode ser feito e uma métrica de desempenho (novamente a forma de medir o sucesso) e a máquina aprende como deve-se fazer. A forma mais simples de entendê-lo é com o jogo do dinossauro do Google, que jogamos quando estamos sem acesso à internet. Ganha-se pontos à medida que caminha-se pelo cenário pulando cactos e abaixando-se na presença de pterodáctilos. Ensina-se, portanto, à máquina, que as ações possíveis são pular ou se abaixar, e que o objetivo é aumentar o score. Com isso, depois de chocar-se com cactos e pterodáctilos, e assim, o score parar, a máquina descobre que deve-se pular na presença dos primeiros e abaixar-se, quando aparece o segundo. Além disso, a máquina aprende que é ainda melhor andar abaixado, não sendo necessário preocupar-se com o momento oportuno de fugir dos animais voadores. O jogo milenar chinês GO teve suas regras aprendidas pelo sistema AlphaGo que aplicou estratégicas nunca usadas por humanos na hora de jogar. A preocupação dos humanos na busca pela vitória passava sempre pelo adversário, quando a máquina descobriu que era bem mais vantajoso preocupar-se em conquistar territórios para ganhar.

É interessante pensar, portanto, que tudo tem regra, mas é surpreendente como elas são definidas dependendo do que você entende por sucesso. Isso é uma analogia perfeita da vida! Quantos de nós estamos correndo abaixados para não esperar os momentos oportunos, baseados em uma métrica qualquer que definimos como sucesso. Talvez existam tantas outras que poderiam te levar a outras tantas regras diferentes. Aprendizagem de máquina, assim, busca sempre por modelos que representam padrões. Parte-se do pressuposto que existe um padrão para tudo. O sucesso da aprendizagem de máquina, portanto, é porque as máquinas estão se tornando cada vez mais humanas, ou nós somos cada vez mais padrões??

Clique aqui para ler todos os textos de Thaís Gaudencio

A globalização, as formas de comunicação e o acesso à informação nos tornam cada vez mais iguais. As regras nos governam, de forma necessária, evitando o caos, mas, muitas vezes, questionável. Na série Unabomber, sobre o terrorista, anarquista e prodígio matemático Theodore Kaczynski, uma cena reflete o controle nos imposto, quando em uma cidade segura, de madrugada, em um cruzamento, sem nenhum carro por perto, mas em um semáforo vermelho, um automóvel para e espera pelo momento “certo” de seguir viagem. A estética, consumo e hábitos se repetem. São os mesmos cabelos, mesmas roupas, músicas e sugestões, onde você, necessariamente, TEM que pertencer a algum grupo e se parecer com alguém.

É cada vez mais fácil prever em um mundo cada vez menos diverso e mais repetido. Os caminhos são os mesmos, as horas são as mesmas… Estamos indo de encontro, inclusive, a uma das teorias que rege nossas vidas, quando Darwin demonstra nossa evolução como resultado de adaptações bem sucedidas e da importância da diversidade, que reflete essas diferentes adaptações. As diferenças, portanto, fundamentalmente, deveriam, a rigor, ser respeitadas. Como isso acontecerá em um mundo cada vez mais máquina, menos humano, mais inteligência artificial, onde cada vez mais negamos as surpresas ao mudar as frequências do rádio para ouvir as sugestões do Spotify??

A aprendizagem de máquina é uma subárea da Inteligência Artificial (IA). Essa última, apesar do grande uso em nosso cotidiano atualmente, surgiu ainda na década de 50 e segue quatro grandes linhas de pensamento desde sua criação: fazer com que máquinas pensem como humanos, ajam como humanos, pensem racionalmente ou ajam racionalmente.

Hoje, na prática, a IA é um pouco de todas elas. A neurociência até hoje não sabe explicar como os humanos pensam. E mais, como programar o instinto e o livre-arbítrio? Agir como humano nos remete automaticamente para o famosíssimo Teste de Turing, onde em seu nível HARD, se fosse um jogo, assistiríamos à Ex machina ou a Westworld, onde máquinas são tão humanas que os humanos duvidam de sua origem e máquinas não se entendem não humanas. Pensar de forma racional exige que sempre existam proposições declarativas que se conectam de tal modo que, a partir delas, é possível deduzir conclusões. Os silogismos de Aristóteles!! Existem silogismos para todas as situações possíveis aos homens? 

A última das linhas é agir racionalmente, que parte do pressuposto que existe um jeito certo de executar uma ação. Esse jeito, na verdade, é a reprodução, tida como certa, da forma como o humano a realiza. Quantas formas são possíveis de várias ações serem feitas?? Quem define o que é certo?? Para isso, uma das principais definições de aprendizagem de máquina é de que baseados em experiências humanas ou não, tentamos melhorar a execução de tarefas considerando alguma métrica, que trataremos como o sucesso da máquina em ser “inteligente”. É uma grande simplificação de um dos conceitos mais difíceis de explicar. O que é ser inteligente?!? Fala-se de inteligência na capacidade de Rodin ao esculpir corpos em mármore, onde enxergamos veias e cicatrizes, mas como entender a genialidade de Pollock ou a expressão dos sentimentos de Munch e seu grito??? É arte, e a tarefa de fazer uma máquina criar arte torna-se ainda mais difícil. Arte envolve emoções, máquinas não as têm, mas quais de nossas ações não envolvem sentimentos?!?

No curso sobre “Forma e Estilo no Cinema” com Pablo Villaça, nos são apresentados (pelo menos para mim) detalhes técnicos que normalmente ignoramos na sétima arte.

Em uma etapa do encontro ele nos mostrou os padrões das narrativas e do grande prazer humano em encontrá-los. Sempre falo disso em sala, de como, desde muito pequenos, curtimos agrupar brinquedos, roupas, amigos… Ou melhor! E isso eu sempre tinha ignorado… de que além de gostarmos de criar padrões, é de como amamos os reconhecer. Ele usou a expressão do momento quando isso acontece… “Dá aquele calor no coração!”.

O prazer de reconhecer um padrão é fantástico. É descobrir a charada!! É quando cantamos uma música que desconhecemos a letra, vamos juntos com o cantor e acabamos acertando a rima. Ou reconhecemos que depois daquele número, no desafio da avó, vinha o que você imaginava (e ela tanto esperava).

Pablo trouxe isso pro cinema e de como os diretores brincam com o telespectador quando ele usa o padrão na narrativa para nos dar o prazer de o reconhecer, o prazer de nos surpreender, quebrando o padrão descoberto, e a expectativa de nos deixar ansiosos se de fato o padrão foi reconhecido. O exemplo dado por uma aluna nesse momento foi o do filme Tubarão, de Spielberg, quando ele sempre anunciava a vinda do animal com aquela música (Jaws) (também por restrições financeiras e de tempo), que todo mundo já conhece, e magicamente, em um dos ataques, o prenúncio não existiu. O padrão foi por água abaixo. E outras coisas também.

Sim! Um filme nunca mais será visto da mesma forma.

Acho que uma das grandes alegrias de trabalhar com IA é descobrir, com a conclusão de um projeto ou de uma pesquisa, os padrões não tão óbvios de um conjunto de dados. Trabalhar com IA, no fim das contas, é viver com aquele calor no coração!

Assistam aos filmes Ela, Ex-machina e AlphaGo, sobre IA e padrões, que talvez acalorem os corações de vocês!!

Compartilhe: