Mãe, mulher, jornalista e repórter da TV Câmara de João Pessoa. Escritora de crônicas nunca publicadas.
Mãe, mulher, jornalista e repórter da TV Câmara de João Pessoa. Escritora de crônicas nunca publicadas.
Nossos atacantes da semana e meu futebol possível
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(Foto: Lucas Figueiredo/CBF)

Há mais de 100 anos o Brasil desistiu de sediar a Copa América por causa da pandemia da gripe espanhola. E daí?, você me pergunta, mais de meio século depois, sem se importar com o tanto de derrotas acumuladas no já pontuadíssimo cartão de humilhação do nosso Brasil. E daí?, eu te respondo, daí, que, as vezes, uma única decisão, umazinha que seja, pode ser capaz de produzir uma revolta tão grande, que não há futebol canarinho que nos faça manter a esperança. 

Tudo bem, eu sei que existe esse papo clássico de ópio do povo e coisa e tal, e não sou ingênua a ponto de acreditar que um placar sozinho possa virar de bate-pronto um jogo tão violento como esse que estamos assistindo desde março do ano passado. Mas, se o nosso presidente decidiu, junto com essa Conmebol, chutar pra fora da rede dessa nossa Alemanha particular, agora, nesses primeiros dias de junho, com uma pandemia catastrófica, quando já contabilizamos 484.000 mortes, e 484.000… ah… 484.000 pode ser definitivo.

Perdi a conta de quantas vezes fui salva por um filme ou por uma canção. No cinema, “A felicidade não se compra”, “Deus e o Diabo na terra do sol”, ”Os incompreendidos”, “Sociedade dos poetas mortos”, “Terra estrangeira”… Muitas vezes, já elaborei mais, imersa em duas horas de uma história sensível e bem contada dentro da sala escura, do que em anos e anos de divã freudiano matando e ressuscitando pai e mãe.

Nossos atacantes da semana, Bolsonaro e Conmebol, foram responsáveis, respectivamente, por jogar fogo sobre questões bastante específicas e caras à minha passagem por aqui. Lembrei de “O som ao redor”, de Kleber, que nunca saiu do meu HD, tendo ele, me clareado o fascismo, até então intuitivo, que eu identificava na ideia de condomínios, e traduzido, com perfeição, a poesia um tanto melancólica que sempre enxerguei nas estradas do meu país.

Escrevendo e tentando falar do meu futebol possível, lembro de Chico… sim, Chico Buarque de Holanda… — Chico e futebol tem tudo a ver, não é? bom, Chico Buarque, desde “João e Maria”, quando eu ainda era criança e já o ouvia dizer que agora ele era herói e o seu cavalo só falava inglês, desde então Chico é minha promessa de fé, meu último suspiro de amor, e, mesmo quando duvido de tudo, sigo de mãos dadas com aquele Brasil de mais de meio século atrás. Ainda hoje, nos dias tristes, quando lembro que somos governados por aquele sujeito tão pequeno, ou quando vejo o Estado seguir exterminando pretos e pobres dentro e fora de Jacarezinhos ou soterrados sob sangue e milícias, ainda hoje é a arte que me mantém de pé.

Estamos em junho tendo vivido um ano absolutamente trágico na terra brasilis. 484.000 mortes em pandemia e uma Copa América, não são apenas duas bolas fora no sete a um diário do nosso povo. E, também, se forem, já é muito. Muito mesmo.

Tá sete a zero. Mas dia 19 tem nova manifestação contra a omissão e o descaso desse governo. Sigamos, Brasil. Rumo a virada, quem sabe. O jogo só acaba quando termina.

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