Jornalista e doutoranda em Informação e Comunicação em Plataformas Digitais pela Universidade do Porto (PT). Autora do livro Flores nos Canteiros (A União, 2018). Interesse em temas sobre feminismo, viagens, comunicação e redes sociais. flavia.lopes.sn[a]gmail.com
Jornalista e doutoranda em Informação e Comunicação em Plataformas Digitais pela Universidade do Porto (PT). Autora do livro Flores nos Canteiros (A União, 2018). Interesse em temas sobre feminismo, viagens, comunicação e redes sociais. flavia.lopes.sn[a]gmail.com
O preço que se paga 
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(Foto: Flávia Lopes)

Muita gente costuma me perguntar quanto custa morar fora do Brasil. Na Europa. Mais especificamente em Portugal. Sempre antes de responder eu respiro fundo. Não é uma pergunta fácil. 

A primeira coisa que eu penso em falar é sobre moradia. E quase sempre dá vontade de responder: “o aluguel é caro para morar em um lugar que lhe custa chamar de casa”. É que eu – ainda- não encontrei um lugar em que pudesse descansar e dizer com uma paz de espírito inabalável: “home sweet home!”. Porém, adaptei-me muito bem. Apesar das dificuldades de arrendar uma casa para imigrantes aqui em Portugal, consegui algumas façanhas de boa moradia, indo contra as más estatísticas. 

Mas, para além de cerca de 500 euros, o preço que se paga por um aluguel é alto para não se sentir o valor do pertencimento. O teto de tijolos protege da chuva, mas um verdadeiro abrigo é muito mais que uma construção.

A segunda coisa que eu penso em explicar é sobre alimentação. É quase tudo igual. Aqui tem feijão, arroz, carne. O tempero familiar depende de quem cozinha. Se você fizer suas compras e você cozinhar para si, vai buscar o gosto conhecido dos sabores da sua terra. Até tapioca e cuscuz encontrei aqui. 

Mas claro que a fartura do gosto da terra natal é incompleta. Faltam algumas frutas tropicais que encontramos fáceis no Brasil, no meu caso mais especificamente, no Nordeste. No entanto, o que sinto mais falta é do suco de caju que meu pai faz quando estou gripada. Ou do suco de acerola que minha me dá quando estou com alergia. Isso não se encontra no supermercado. Minhas compras mensais de comida ficam em torno de 200 euros, mais a lacuna dos sabores do Nordeste e os juros de saudade parcelados em doses diárias durante o mastigar do pão nosso de cada dia. É caro.

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Fora moradia e alimentação, onde gasta-se alguns muitos euros regados de muito suor, o que ninguém conta é o preço que se paga pela solidão. A saudade é também bastante cara. E em horas de luto a inflação sobe. Viver fora custa caro quando não se tem o abraço familiar, o colo da mãe, a risada do pai, o último adeus da presença de quem a gente ama.

Senti essa inflação inflamar-me na última semana. Entre euro e real, o que mais valia para mim era a presença que eu já não tinha mais. A distância aumentou o valor entre o câmbio dos afetos quando a minha avó partiu. Eu só pude lhe dar o meu último adeus por uma chamada de vídeo que fiz no Dia das Mães deste ano. Não pude estar presente em seu funeral. Foi difícil não poder chorar no colo dos pais, não poder acolher minha família em um abraço consolador e nem poder entregar uma rosa sequer no seu túmulo naquela terça-feira triste e ensolarada. Nunca paguei um preço tão caro por viver em Portugal. 

Então, quando alguém me perguntar quanto custa morar fora vou só responder que o preço que se paga é alto e paga-se com uma parte do coração.

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