Jornalista, fotógrafo e consultor. Mestre em Computação, Comunicação e Artes pela UFPB. Escreve desde poemas a ensaios sobre política. É editor no Termômetro da Política e autor do livro infantil "O burrinho e a troca dos brinquedos". Twitter: @gesteira.
Jornalista, fotógrafo e consultor. Mestre em Computação, Comunicação e Artes pela UFPB. Escreve desde poemas a ensaios sobre política. É editor no Termômetro da Política e autor do livro infantil "O burrinho e a troca dos brinquedos". Twitter: @gesteira.
Se as pessoas soubessem o que aconteceu ficariam enojadas
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Ronaldo era a principal esperança do ataque brasileiro na final contra a França em 1998 (Foto: Reprodução/YouTube)

Talvez isso explique a razão de o jogador (insira aqui o nome de qualquer coadjuvante de equipe derrotada) ter declarado a seguinte frase: ‘Se as pessoas soubessem o que aconteceu em (insira o local da derrota, ou da competição), ficariam enojadas!

O trecho citado acima é parte de um boato que circula na internet há mais de 20 anos e que, volta e meia, após ser reajustado para uma nova situação, é novamente disseminado por espalhadores de fake news, ou incautos que acreditam em tudo aquilo que recebem por meio de aplicativos de mensagens instantâneas. Quando foi criado, sequer existia o WhatsApp. Hoje em dia, apesar de estar batido para quem já viu tanta mentira na rede, ainda pega muita gente de surpresa. Portanto, é preciso ficar atento, pois até como forma de ironia ele pode surgir nesta reta final de Campeonato Brasileiro, e como quem lê nem sempre percebe a brincadeira, pode até passar adiante, mesmo sem querer, uma informação falsa. 

Até hoje sem identificação de autor, o texto teve sua primeira aparição logo após a Copa do Mundo de 1998, na França. Se atribuía ao jogador Leonardo a célebre frase “Se as pessoas soubessem o que aconteceu na Copa do Mundo, ficariam enojadas!”. O texto surgiu depois da derrota da Seleção Brasileira por 3 a 0 para os donos da casa, e seu tom conspiratório coincidia com o clima conturbado, somado à falta de informações a respeito da situação de saúde de Ronaldo, maior esperança de gols do escrete canarinho. Por meio de correntes e listas de e-mails, a teoria de que o Brasil teria vendido a final para a França logo viralizou. 

A justificativa de uma possível venda de resultado quando envolve a Seleção Brasileira nada mais é do que a alternativa mais fácil de se encarar do que aceitar o fracasso. O ego sobre o Brasil no futebol é tanto que o torcedor prefere acreditar numa conspiração a admitir que o time adversário seja melhor. Foi assim em 1998, contra a equipe de Zidane, e também foi assim em 2014, na tragédia do 7 a 1, em casa, diante dos alemães.

Vale lembrar que em 2014, na Copa do Mundo que o Brasil deu vexame em casa, também circulou o texto, dessa vez com o atacante Fred como dono da frase “se as pessoas soubessem…”. 

De todos os pontos que compõem uma notícia falsa, dois chamam a atenção para esta de modo específico: o uso recorrente no meio esportivo e a forma como ela é alterada para se tornar perfeitamente aplicável para as mais diversas situações, apenas com a substituição de elementos, como numa receita de bolo cheia de lacunas em que basta trocar um ingrediente por outro, contanto que se mantenha o açúcar, os ovos, a manteiga e o fermento para que o bolo funcione. 

O texto falacioso segue dizendo que “todos os torcedores ficaram tristes, não deveriam!”, e afirma que se trata de notícia em primeira mão, que está sendo investigada por grandes veículos da mídia e será divulgada. Logo depois vem a mentira principal, da venda do resultado. 

Quem tende a acreditar em teorias da conspiração sente-se privilegiado ao receber esse tipo de conteúdo. Veja só, a pessoa fica sabendo de um grande conchavo, por meio de uma corrente sabe-se lá de onde, antes da imprensa e das autoridades policiais. É muita inocência de quem crê. 

Então, se nesta reta final do Brasileirão a corrente voltar dizendo que São Paulo ou Flamengo venderam o título, leia até o fim somente para dar risada. Se estes dois estiveram com a mão na taça e não estão mais, é por incompetência mesmo.

Texto publicado na edição de 29.01.2021 do jornal A União

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