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Baterista dos Garotos Podres desmoraliza delegada com resposta em inquérito: “Papai Noel não existe”
Termômetro da Política
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Quarenta anos após o lançamento de um de seus maiores sucessos, a banda punk Garotos Podres enfrenta um inquérito policial motivado por denúncia de cristãos conservadores relacionada ao repertório apresentado em show. O caso, revelado pelo vocalista Mao ao portal g1 nesta semana, envolve a análise de gravações da apresentação e das letras das canções, com destaque para a faixa Papai Noel Velho Batuta, lançada em 1985.

Banda Garotos Podres resolve questão com argumento terminativo: “Papai Noel não existe”
Banda Garotos Podres resolve questão com argumento terminativo: “Papai Noel não existe” (Foto: Divulgação)

Durante oitiva realizada por carta precatória, o baterista da banda foi questionado pela delegada sobre o suposto motivo de ofensa a Papai Noel. A resposta do músico foi direta: “Papai Noel não existe”.

Mao, que também é professor de história aposentado, enviou trechos do inquérito à reportagem, mas optou por não divulgar o estado nem a unidade policial responsável, seguindo orientação jurídica para evitar dar visibilidade a grupos extremistas e expor autoridades envolvidas. A Secretaria da Segurança Pública informou que “um dos integrantes da banda mencionada foi ouvido em Termo de Declarações pelo Setor de Cartas Precatórias da Seccional de São Bernardo do Campo sobre um caso de racismo que é investigado pela Polícia Civil do estado da Paraíba”.

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A música em questão, que completa 40 anos em 2025 e continua no repertório da banda, traz versos de crítica ao sistema capitalista, escritos e aprovados ainda durante a ditadura militar. No entanto, segundo o inquérito, a canção “incentiva a violência contra pessoas de bem” e representaria, de forma subliminar, a “cultura da violência”. As autoridades teriam argumentado que Papai Noel é uma figura cristã de grande apelo popular e religioso no país. Para os integrantes do grupo, o personagem funciona como metáfora do capitalismo e da desigualdade social, inserindo-se no contexto histórico e político do punk rock dos anos 1980.

A denúncia foi registrada no primeiro semestre de 2025, após a realização de um show. O empresário responsável pela contratação foi intimado a comparecer a uma delegacia, e os integrantes da banda foram posteriormente interrogados de forma remota. A delegada responsável instaurou um inquérito com “dezenas de páginas”, que analisou não apenas as letras, mas também as falas proferidas entre uma canção e outra durante a apresentação. Mao foi ouvido no último dia 28 de novembro em uma delegacia seccional do ABC Paulista.

Para o vocalista, o episódio configura uma clara tentativa de censura. Ele compara a situação às práticas da ditadura militar, quando artistas eram monitorados por órgãos de repressão. “É um processo político no sentido de polícia política. Analisar letra de música, questionar canções, é algo absurdo”, afirmou.

Mao expressou surpresa com o teor da investigação e classificou a denúncia como caluniosa. Ele lembrou que a banda surgiu no final da ditadura e que Papai Noel Velho Batuta foi aprovada pelo Departamento de Censura da Polícia Federal na época, enquanto outras músicas foram barradas. “Quando foi lançada, Papai Noel Velho Batuta foi aprovada, enquanto outras músicas foram barradas. Em todos esses anos, eu nunca vi uma coisa dessas”, declarou.

Como forma de resposta ao caso, os Garotos Podres lançaram no início de dezembro uma animação satirizando a investigação, com o objetivo de chamar atenção para o episódio. “Às vezes, denunciar com humor é interessante. A música já nasce como denúncia, mas bem-humorada”, explicou Mao. A banda também produziu um novo clipe animado da canção, no qual figuras extremistas contemporâneas — inexistentes no cenário dos anos 1980, como Donald Trump e o “Zombilavo de Carvalho” — são incorporadas à narrativa, reforçando o caráter satírico e crítico da obra original.

O inquérito foi concluído recentemente e agora o grupo aguarda a decisão do Ministério Público, que poderá arquivar o caso ou oferecer denúncia.

Com informações dos portais g1 e Fórum.

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