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CNH sem autoescola: curso teórico poderá ser feito em plataforma online e prova prática com carro automático
Termômetro da Política
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O governo federal está prestes a transformar o processo de obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) no Brasil. Uma proposta, que será colocada em consulta pública nas próximas semanas, elimina a obrigatoriedade de aulas práticas mínimas, torna o curso teórico gratuito por plataforma online e permite que o candidato escolha entre prova em carro manual ou automático. A meta é incluir cerca de 20 milhões de condutores não habilitados, majoritariamente motociclistas, que hoje dirigem informalmente, segundo a Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran). “O que existe no modelo de hoje é uma barreira de entrada que empurra essas pessoas para a informalidade. A proposta é dar acesso e cobrar desempenho na prova. Quem souber, passa. Quem não souber, não passa”, afirmou o secretário nacional de trânsito, Adrualdo Catão, em entrevista exclusiva.

Atualmente, tirar a CNH custa entre R$ 3 mil e R$ 4 mil, incluindo autoescola, taxas e exames médico e psicológico (Foto: Lidiana Cuiabano/Detran-MT)

Novo modelo de formação e prova

A proposta transfere a responsabilidade da formação prática para o candidato, com o exame prático assumindo o papel central na avaliação. A exigência atual de 20 horas de aulas práticas será extinta, permitindo que o candidato decida quantas aulas deseja fazer, ou mesmo nenhuma, antes da prova. “O cidadão é quem decide. E a prova será mais exigente. Não é para ser difícil por ser difícil, mas para avaliar domínio do veículo e noção de segurança. Hoje, muitos passam só com o controle básico do carro ou da moto”, explicou Catão. A prova prática passará a ser realizada em vias públicas, como previsto na legislação, mas ainda pouco aplicado, substituindo circuitos fechados. O sistema de “faltas eliminatórias” será trocado por uma pontuação gradual, reduzindo o nervosismo e priorizando o desempenho técnico. Outra novidade é a opção de realizar a prova em carro manual ou automático, com liberdade para escolher a transmissão também nas aulas práticas, se contratadas.

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O curso teórico, embora continue obrigatório, ganhará uma plataforma gratuita no site da Senatran, no formato EAD, sem aulas ao vivo. “Vamos oferecer uma plataforma gratuita para o curso teórico. Não precisa ser síncrono, como as autoescolas sugerem, para não gerar mais custo. O cidadão vai estudar no seu tempo e fazer exercícios, e o sistema consegue controlar a presença. Isso já é usado em universidades, por que não no trânsito?”, destacou o secretário. Candidatos que cursaram educação para o trânsito em escolas poderão ser dispensados dessa etapa, e as autoescolas ou Detrans continuarão oferecendo o curso presencial para quem preferir. O exame médico também pode deixar de ser exclusivo de clínicas credenciadas, reduzindo custos e a reserva de mercado.

Impacto nas autoescolas e custos

Atualmente, tirar a CNH custa entre R$ 3 mil e R$ 4 mil, incluindo autoescola, taxas e exames médico e psicológico. Com a proposta, o custo pode cair para R$ 750 a R$ 1 mil, já que as aulas em centros de formação de condutores (CFCs) serão opcionais. A Feneauto, que representa as autoescolas, relatou queda nas matrículas de novos alunos após o anúncio. Apesar disso, o governo garante que as autoescolas não serão extintas, mas terão um novo papel. Candidatos poderão contratar instrutores autônomos credenciados, sem vínculo obrigatório com CFCs. “Hoje o instrutor precisa obrigatoriamente estar vinculado a uma autoescola. Isso cria reserva de mercado. A gente vai liberar o instrutor para atuar de forma independente”, afirmou Catão, comparando o modelo a um personal trainer. Instrutores precisarão de qualificação reconhecida pela Senatran, credenciamento no Detran e veículos identificados, mas sem exigência de duplo comando, câmbio manual ou idade mínima do carro.

As autoescolas também ganharão flexibilidade, sem exigência de número mínimo de veículos ou estrutura física rígida, podendo oferecer pacotes mais acessíveis com carros automáticos. “As autoescolas têm exigências absurdas. Têm que ter sala com quadro de medidas específicas, número mínimo de carros, estrutura física cara. Mas a realidade é que nunca tentaram reverter isso, pois cria barreiras de entrada”, criticou o secretário. Ele destacou que a proposta visa aumentar a concorrência e baratear os custos.

Polêmicas e respostas às críticas

A possibilidade de realizar a prova prática sem aulas formais gerou debate. Catão reconhece que, em tese, isso será possível, mas argumenta que a maioria dos 20 milhões de condutores não habilitados já dirige, especialmente motos, e o foco é formalizá-los. “O que a gente está fazendo não é liberar a informalidade. É incluir quem já está nela. A maioria dessas 20 milhões de pessoas está em cima de uma moto, sem habilitação, porque não tem como pagar R$ 3.000 para se regularizar”, defendeu. Ele rebateu críticas sobre o risco de piorar o trânsito caótico do Brasil: “E se justamente esse modelo atual, caro e burocrático, for parte do problema? A gente está aumentando o número de acidentes, enquanto a taxa de novos habilitados está caindo. Isso mostra que o modelo atual pode estar falhando.”

O ensino por familiares, como em países como Canadá e EUA, não será permitido, a menos que a lei mude, o que não está em discussão. O aprendizado prático exigirá instrutores credenciados. A Feneauto alega não ter sido ouvida, mas Catão afirma que houve reuniões, sem propostas viáveis do setor para reduzir custos. “Em um dos documentos, eles propõem que a própria autoescola determine quantas aulas o aluno precisa. Isso é um conflito de interesses, não funciona”, disse.

Processo e consulta pública

A proposta não exige aprovação do Congresso, pois as regras estão em resoluções do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). Após a consulta pública, que durará 30 dias, o texto será votado no Contran, com representantes de Detrans, municípios, usuários e governo. “Tudo está dentro da nossa governança. Não precisa de projeto de lei. A gente ouviu os Detrans, estamos ouvindo os instrutores, e vamos aprimorar a proposta com base na consulta”, garantiu Catão. O setor de autoescolas, no entanto, planeja formar uma frente parlamentar e pedir audiência pública para tentar frear a iniciativa.

A proposta busca equilibrar acesso, segurança e competitividade, mas enfrenta resistência em um setor historicamente estruturado. A consulta pública será decisiva para definir o futuro da formação de condutores no Brasil.

Com informações do portal Uol.

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