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Bandidos em nome de Jesus: facção evangélica Terceiro Comando Puro avança pelo país e já marca presença no CE
Termômetro da Política
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Uma estrela de Davi gigante de neon, instalada no alto de uma caixa d’água em Parada de Lucas, na Zona Norte do Rio, era o cartão de visitas do Complexo de Israel, conjunto de cinco favelas dominado pelo Terceiro Comando Puro (TCP). No último dia 11 de março, policiais militares derrubaram o símbolo e demoliram a mansão de luxo do chefe local, Álvaro Malaquias Santa Rosa, o “Peixão”, construída dentro de área de proteção ambiental. Peixão, porém, segue foragido e nunca esteve preso.

No Ceará, a intolerância religiosa também acompanha a chegada do grupo. Em outubro, pelo menos quatro terreiros de umbanda foram fechados por ordem da facção em Maracanaú e Pacatuba (Foto: Reprodução/Redes sociais)

A operação policial não conteve a expansão da facção. Relatório recente da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) aponta o TCP como o terceiro maior grupo criminoso em atividade no país, atrás apenas do Comando Vermelho (CV), seu rival histórico, e do Primeiro Comando da Capital (PCC). Nos últimos 12 meses, a organização avançou para Espírito Santo, Minas Gerais, Goiás, Bahia, Ceará, Amapá, Acre, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul.

Uma das fronteiras mais recentes conquistadas foi o Ceará. Desde setembro, estrelas de Davi e pichações com “Jesus é dono do lugar” apareceram em Maracanaú, na região metropolitana de Fortaleza. No mesmo período, 37 membros do TCP foram presos na Grande Fortaleza. A entrada no estado se deu por aliança com o enfraquecido Guardiões do Estado (GDE), que, após perder líderes em repressão policial, viu parte de seus integrantes migrar para a facção carioca.

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“Esse é o movimento padrão de expansão das facções criminosas, que é de incorporação dos grupos locais”, explica a coordenadora do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da UFF, Carolina Grillo.

Pesquisadores destacam três pilares que impulsionam o crescimento do TCP: relação menos conflituosa com a polícia, aliança estratégica com o PCC — que abriu portas para mercados internacionais de drogas e armas — e proximidade com práticas típicas de milícias, como extorsão de comerciantes e cobrança de “pedágio” de empresas.

No Ceará, a intolerância religiosa também acompanha a chegada do grupo. Em outubro, pelo menos quatro terreiros de umbanda foram fechados por ordem da facção em Maracanaú e Pacatuba. A Polícia Civil investiga os casos.

O antagonismo com o Comando Vermelho, historicamente ligado a religiões de matriz africana, alimenta uma guerra que pesquisadores chamam de “espiritual”. “O combate de inimigos passa a ser compreendido como guerra espiritual”, observa a pesquisadora Kristina Hinz, da Uerj. A violência, segundo ela, é justificada como “purificação religiosa e combate às forças diabólicas”.

No estado que já teve a maior taxa de homicídios do país em 2017, moradores temem que a nova disputa territorial reacenda a onda de violência. Em agosto, tiroteios forçaram o fechamento temporário de escolas; em setembro, um vilarejo em Morada Nova virou “cidade-fantasma” após famílias fugirem de confrontos.

Três municípios cearenses ainda figuram entre os dez mais violentos do Brasil, segundo o último Anuário de Segurança Pública. Para especialistas, a combinação de localização estratégica, consumo crescente de drogas e desigualdade social segue alimentando o terreno fértil para facções — agora também as que se apresentam como evangélicas.

Com informações da BBC.

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