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Tradição e fé: a busca por ervas e banhos rituais movimenta o Rio de Janeiro no fim de ano
Termômetro da Política
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O aroma de folhas frescas e o conhecimento popular se mesclam nas ruas do Rio de Janeiro nesta reta final de ano. Das feiras livres da zona norte às esquinas da zona sul, banquinhas de erveiros oferecem saberes ancestrais em forma de ramos e folhas. Embora não haja comprovação medicinal para a cura de doenças, o uso dessas preparações para promover o bem-estar impulsiona a procura por banhos energéticos e rituais típicos de dezembro.

Comércio de ervas para banhos energéticos e espirituais movimenta o Mercadão de Madureira Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)

Na Rua da Carioca, o erveiro José Adaílton de Souza Ferreira comercializa plantas como macassá, levante, manjericão, arruda, alfazema, alecrim e sálvia, que ele define como “as mais procuradas para banhos energizantes ou de ‘descarrego’, contra inveja e olho grande”. Segundo Ferreira, a melhora de quem utiliza os ramos é visível. Ele orienta que os clientes devem “cozinhar ou esfregar, um dos dois, e depois jogar da cabeça aos pés” para obter os efeitos desejados, como o de abrir caminhos e vencer desafios.

As tradições indígenas e de matriz africana são pilares desse consumo. No candomblé, as folhas, ou ewés, são essenciais por carregarem o axé. Mãe Nilce de Iansã, do terreiro Ilê Omolu Oxum, ressalta a importância vital da flora com o ditado iorubá “Kò si ewé, kò si Orixá”, que significa que sem folha não existe orixá, pois a divindade é a própria natureza. Ela explica que as plantas servem para fins religiosos, terapêuticos e alimentares, e que a Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras busca o reconhecimento dessas ações nos terreiros como práticas de saúde. Mãe Nilce reforça que “não estou falando de cura, mas de cuidado”, e pontua que as ialorixás e babalorixás estudam para serem guardiões desse conhecimento.

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A ciência também reconhece os benefícios dessas práticas rituais para o bem-estar. Aline Saavedra, doutora em biologia vegetal e professora da Uerj, esclarece que, embora não existam pesquisas sobre a proteção espiritual em si, o sentimento de segurança gerado pelos ritos traz benefícios reais. De acordo com ela, “em relação ao bem estar, o fato de as pessoas se sentirem mais protegidas, obviamente, muda a química do nosso cérebro positivamente, e isso traz benefícios”. Entretanto, a doutora alerta para os riscos de toxicidade em chás de uso prolongado e a dificuldade de diferenciar folhas secas moídas.

Para os erveiros, o trabalho também é uma questão de identidade. João, que cultiva plantas sem agrotóxicos em Irajá e as vende no Bairro de Fátima, foca exclusivamente no aspecto espiritual e evita prescrever chás para evitar riscos. Ele afirma que o ofício está ligado à sua história pessoal e ancestralidade, destacando que “as ervas de banho, de tempero, tem tudo a ver comigo, com a minha religião, com o que me identifica como pessoa, e com a minha origem racial”. Como alternativa universal para renovação, especialistas e religiosos sugerem o contato direto com a natureza, como banhos de mar, rio ou cachoeira.

Com informações de Agência Brasil.

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