A credibilidade internacional do presidente Donald Trump sofreu um novo golpe após o ataque de Israel a membros do Hamas em um bairro residencial do Catar, na terça-feira (9), que matou cinco pessoas, mas não os principais negociadores de um plano de cessar-fogo dos EUA para Gaza. Trump afirmou que não foi sua decisão e que informou o Catar assim que soube da ação. “Não estou entusiasmado com toda a situação”, disse Trump ao ir jantar em um restaurante de carnes em Washington. “Não é uma boa situação… não estamos felizes com o jeito que isso aconteceu”, completou, em um raro tom de moderação.
O ataque, que ignorou os interesses vitais dos EUA, é mais uma humilhação para Trump, que também enfrenta desafios com o presidente russo Vladimir Putin, que intensificou ataques a civis na Ucrânia após uma cúpula em Anchorage, no Alasca. Nesta quarta-feira (10), a Polônia informou que abateu drones russos que violaram seu espaço aéreo durante um ataque à Ucrânia. O secretário-geral da OTAN, Mark Rutte, classificou a violação como “absolutamente imprudente” e “não um incidente isolado”, afirmando que a OTAN defenderá “cada centímetro” de seu território.
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Apesar de Trump parecer genuíno em seu desejo de ser um mediador global, prometendo em janeiro, ao retornar à Casa Branca, encerrar rapidamente as guerras em Gaza e na Ucrânia, ambos os conflitos estão mais intensos oito meses depois. Líderes como Putin, Xi Jinping (China) e Narendra Modi (Índia) desafiam abertamente sua autoridade. O ataque de Israel em Doha, aliado crucial dos EUA que abriga a maior base militar americana no Oriente Médio, foi visto como uma afronta pessoal a Trump, especialmente por ocorrer após uma reunião na segunda-feira (8) entre o conselheiro de Benjamin Netanyahu, Ron Dermer, e o enviado de Trump, Steve Witkoff, sem menção à operação. “Os ataques ocorrem em um momento muito sensível nas negociações de cessar-fogo, onde o governo Trump, o presidente e seu enviado Witkoff deixaram claro que o presidente busca um cessar-fogo abrangente, a libertação de todos os reféns, troca de prisioneiros e o fim da guerra em Gaza”, disse o ex-embaixador dos EUA em Israel, Edward Djerejian, à CNN International. “Israel obviamente não está prestando muita atenção aos interesses de segurança nacional dos EUA”, completou.
O ataque em Doha, conduzido em plena luz do dia, compromete as negociações de paz mediadas pelo Catar a pedido dos EUA e pode levar o emirado a abandonar as conversas. O primeiro-ministro do Catar acusou Israel de praticar “terrorismo de Estado”. “Bombardear unilateralmente dentro do Catar, uma nação soberana e aliada próxima dos Estados Unidos que trabalha arduamente, correndo riscos conosco para negociar a paz, não promove os objetivos de Israel ou da América”, afirmou a secretária de imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt, em uma rara crítica a Israel pelo governo Trump. O presidente esclareceu no Truth Social que “essa foi uma decisão tomada pelo primeiro-ministro Netanyahu, não foi uma decisão tomada por mim” e ordenou ao secretário de Estado, Marco Rubio, que finalizasse um pacto de cooperação em defesa com o Catar.
Israel justificou o ataque, afirmando que persegue líderes terroristas onde quer que estejam. Netanyahu, que conduz operações contra Hezbollah no Líbano, Houthis no Iêmen e Irã, declarou que “os dias em que os líderes do terror gozavam de imunidade em qualquer lugar acabaram”. Ele esclareceu que a operação foi uma “operação exclusivamente israelense”, tentando oferecer cobertura diplomática a Trump. No entanto, especulações no Oriente Médio questionam se Trump deu aval tácito, já que caças, possivelmente F-35 americanos, foram usados. A Casa Branca afirmou que os militares dos EUA no Catar alertaram Trump, que ordenou a notificação aos cataris, mas Doha alegou que só foi informada após o ataque.
A ação pode encerrar as esperanças de um acordo de paz em Gaza, priorizando a erradicação total do Hamas por Netanyahu, um objetivo possivelmente inatingível, em detrimento da libertação de reféns israelenses. “É mais uma evidência de que o primeiro-ministro israelense dá mais importância à erradicação total do Hamas — uma tarefa potencialmente impossível — do que ao retorno dos reféns”, observou Djerejian. O ataque também intensificará a ofensiva de Israel em Gaza, que já matou dezenas de milhares de civis palestinos e alienou aliados internacionais.
Para os EUA, as consequências são significativas: o ataque pode abalar a relação entre Trump e Netanyahu, minar a credibilidade de Trump como mediador e comprometer a expansão dos Acordos de Abraão, um marco de seu primeiro mandato. “É um preço bem alto para os israelenses terem conduzido esse ataque”, disse o almirante aposentado James Stavridis à CNN. Além disso, levanta dúvidas sobre a segurança oferecida pela base aérea de Al Udeid, no Catar, e a confiabilidade das garantias de segurança de Trump a outros aliados no Golfo e no mundo. “Se Israel pode atacar o Catar com impunidade, sob as barbas da guarnição dos EUA, outros líderes do Golfo vão se perguntar se serão os próximos”, alertou Stavridis.
Reportagem da CNN Internacional.