Mãe, mulher, jornalista e repórter da TV Câmara de João Pessoa. Escritora de crônicas nunca publicadas.
Mãe, mulher, jornalista e repórter da TV Câmara de João Pessoa. Escritora de crônicas nunca publicadas.
O abandono criminoso no qual se encontra o nosso Brasil
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Ninguém vai fazer uma hashtag dizendo que estamos órfãos? Juliette, bora transformar em ícone revolucionário? Viva o Nordeste! Um ano da morte de Aldir Blanc, preciso escrever sobre isso. E a longevidade de Paulo Guedes?
Vem cá: Só eu tô pensando em sair do Instagram? Achei um absurdo a história dos 1,13 bilhões pra construção de submarinos — e olha que eu não entendo nada de submarinos. Surreal. Pazuello em fuga foi pior que Pazuello presente.

Tem sido assim desde o dia 5 de março, quando decidi escrever pra esse blog. “Afeto e Altruísmos são potentes”, escrevi, na época, sobre a abstinência da vida em tempos de pandemia. Desde então, semana sim, semana não, estou aqui, a postos, eu e meu futebol possível, um misto de egotrip psicanalítica, manual do rebelde e vontade de falar de todos os assuntos ao mesmo tempo. Sei que o caos do qual é feito o meu pensamento que vira texto (sem vírgula) não é o mais sofisticado e nem o mais profundo, que não é o mais engajado e nem o mais jornalístico, que não é o mais poético nem o mais transgressor, porém é o mais meu. Meu caos, pessoal e intransferível, risco e prazer incluídos aí, carne viva. Já fui chamada de ingênua a esquizofrênica descontrolada, comprei duas ou três brigas pelo direct, fiz mais ou menos meia dúzia de declarações de amor, e recebi muitas mensagens bonitas, todas democraticamente respondidas. E hoje, somente hoje, decidi que não vou falar de mim. Muito embora, prefira declarar amor ao Caetano a gastar adjetivos impublicáveis que substituem o nome do presidente, e escrever com liberdade sobre separação, maternidade e neuroses a falar desse asteroide do século 21 chamado covid-19, um vírus de tão mau gosto que chegou no meio desse desgoverno.

Mas quer saber? Impossível não falar de política, ainda mais agora que áudio no WhatsApp passou a ser uma coisa deprimente — não se dá notícia ruim por áudio, gente. Pelo amor de Deus! E depois, o mundo acabou — continua acabando todos os dias.

Não está sendo fácil. E não dá pra confiar em quem está bem. Mas a onda negacionista está diminuindo, agora são menos 24 por cento, muito embora, a novela política protagonizada pelo Clã da família Bolsonaro ainda deva render muitos capítulos patéticos e criminosos.

A última veio da CPI da Covid. A ordem no decreto presidencial dizia pra incluir na bula da cloroquina que ela funcionava como tratamento pra covid. Nosso digníssimo #sóquenão representante maior da nação é um mentiroso, covarde e arrasta ignorantes pra cova. As declarações do ex-ministro Mandetta a respeito das decisões do presidente Bolsonaro, aconteceram na mesma semana em que um ex-colega meu de trabalho morreu vítima da covid-19. Ao que tudo parecia, Djackson era saudável, além de muito jovem, sua comorbidade talvez fosse morar no Brasil. Ele, que fez forte campanha nas redes sociais acreditando no curandeirismo da cloroquina, morreu vítima do negacionismo. Mais um pra conta do presidente.

Pois bem. Anestesiada por quase 420 mil mortes pela pandemia, vi, nessa mesma semana essa doença, poderosa, injusta e avassaladora, ganhar rosto e nome. Paulo Gustavo, inventor e encarnação de Dona Hermínia, a personagem levada ao cinema e que acabou virando a mãe debochada de cada um de nós, entrou para o rol das vítimas brasileiras de um vírus que começou abatendo os idosos e, agora, ataca sem trégua aqueles que ainda têm toda uma vida pela frente.

Escrevo essa coluna neste segundo domingo de maio, dia das mães. E sou tomada por uma dor também avassaladora, a dor de quem fica quando perde alguém. Um sofrimento que a pandemia tem expandido para além das estatísticas usuais. A morte de um filho inverte totalmente a ordem da vida, mas a morte de Paulo foi ainda mais cruel e foi simbólica também, ele deixou o Brasil órfão. A vida não tem mesmo nenhuma garantia, eu pensei. De repente, a partida de Paulo Gustavo parecia não só representar o luto de todos os brasileiros que perderam amigos e parentes neste ano trágico, como também o único grito que faz sentido no meio do abandono criminoso no qual se encontra o nosso Brasil.

Como era de se esperar, a notícia causou profunda comoção nas redes sociais. Mas como quem banaliza ou se acostuma com a morte, a cada manchete — massacre de crianças em Santa Catarina, chacina de Jacarezinho, mais de 400 mil mortos em pandemia — vamos substituindo a dor de ontem pela dor de hoje a ponto de interpor a triste realidade que nos abala.

Chorei ao ler os noticiários desta semana e chorei agora também porque lembrei de quando a morte levou minha mãe, na época, reclamei porque não aceitava o ciclo doloroso da vida. Mas como disse João Cabral de Melo Neto, “A morte a ninguém poupa”. Contudo, a persistência da vida é a única maneira de vencer a ela.

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