Anderson Pires é formado em Comunicação Social – Jornalismo pela UFPB, publicitário e cozinheiro.
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Quantos generais é preciso para uma cavalgadura?
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Foto: Fotos Públicas – Romeu Escanhoela

Bolsonaro e seus generais acabaram com o a mitificação em torno dos militares. Após o fim da ditadura, as Forças Armadas passaram a ter seu papel restrito às suas competências constitucionais e não tiveram mais espaços decisórios na política. Restou ocupar cadeiras no Legislativo após entrarem na reserva, na maioria das vezes, para representar pequenos grupos conservadores e identificados com questões relativas a segurança e uso de armas.

Foi esse pequeno espaço que Bolsonaro ocupou durante sua trajetória política. Passou 30 anos no parlamento, sem apresentar nada de relevante, levantando polêmicas, criando caso com temas ligados à ditadura e destilando preconceitos, principalmente contra mulheres e homossexuais. 

Apesar de muitas vezes usar um discurso duro com relação a alguns crimes, sua trajetória foi sempre condescendente a atuação de milícias. E se alguém procurar nos anais da Câmara dos Deputados, ou em publicações nos meios de comunicação, não encontrará posicionamento algum que confronte o narcotráfico ou o grande crime organizado no Brasil. Seus ataques sempre foram direcionados ao criminoso miúdo, que até os grandes chefes do crime querem se livrar. Na verdade, Bolsonaro foi sempre covarde, um frouxo. 

Mas essa postura lhe serviu de anteparo e muita gente embarcou nas suas bravatas. Além disso, ainda correlacionava o fato de ter sido capitão do Exército, que, para alguns, seria um atestado de integridade, pela rigidez que acreditam existir nas Forças Armadas. 

Para quem conhece um pouco da história, os fatos mostram que o período do Governo Militar passou longe de ser exemplo de honestidade e gestão proba. Basta lembrar alguns absurdos, como comprar oito usinas nucleares e receber apenas uma, ou a famosa Transamazônica, que gastaram o dinheiro sem que nunca tivessem sequer capinado todo percurso. Exemplos de corrupção não faltam. A diferença é que naquela época não existia espaço democrático para denúncias, nem órgãos de fiscalização e controle. Resumindo, os militares faziam o que queriam e quem ousasse discordar era tratado na cacetada.

Isso serviu para criar uma percepção de lisura entre aqueles que acreditam que repressão e violência moldam caráter. Como também, encobria a incompetência dos gestores militares brasileiros. Na verdade, esperar capacidade de gestão de um segmento que é preparado para agir de forma automática, muitas vezes, decorrente de adestramento, que propriamente um processo de treinamento e capacitação, beira a ingenuidade.

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Como na Ditadura: vamos esconder os mortos.

Mas essa história da pouca capacidade de discernimento das Forças Armadas Brasileiras é antiga. No início do século XX, o Exército Brasileiro tinha uma formação mais ampla, não só focada na militarização, com presença de conteúdos como filosofia e sociologia, que apontavam para uma proposta mais humanizada e melhor senso crítico. Porém, após a Coluna Prestes, resolveram desmontar toda essa perspectiva, em decorrência da crença que o modelo adotado anteriormente seria responsável pela formação de líderes revolucionários nas Forças Armadas. Nada mais tacanho, porém, decorre daí essa formação de soldadinhos de chumbo, sem discernimento para sequer identificar demandas básicas do Estado Brasileiro e seu povo. O mais perigoso: alguns desses soldadinhos chegam a patentes de comando, as vezes destacados generais.

Mas chegamos a 2018, Bolsonaro é eleito presidente em decorrência da conjuntura que o país se encontrava, com falta de crença e marginalização da política. A tese do velho militar conservador, que resgataria os valores morais da ditadura e daria voz aos maiores preconceitos foi vitoriosa.

Com Bolsonaro, chegou ao poder uma legião de generais estrelados, que supostamente teriam capacidade para gerir o Brasil com honestidade e competência. No quesito probidade a máscara caiu antes mesmo da posse. As relações de Bolsonaro e seus filhos com as milícias, aliada às práticas de rachadinha, circulação de dinheiro em espécie em transações imobiliárias, como também a contratação de funcionários fantasmas nos seus gabinetes, vieram à tona ainda em dezembro de 2018.

Se alguém queria se enganar com relação a acabar com a corrupção na política, Bolsonaro chegou chegando e até a conta da sua mulher foi usada para recebimento de valores suspeitos, oriundos do esquema organizado pelo seu famoso amigo, O Queiroz. Restava ainda a esperança que os generais ao seu redor conseguissem manter o mínimo de ordem para que o país não tomasse o rumo do precipício.

Por pior que fosse, não era possível que o nível médio dos ministros igualasse o do presidente. Tínhamos um mandatário totalmente incapaz para debater temas de interesse do Brasil. Tudo bem que o General Augusto Heleno já tinha demonstrado pouca inteligência ainda durante a campanha, quando embarcou na brincadeira que existiria um projeto de fundação da URSAL (União das Republiquetas Socialistas da América Latina), vinculado a vitória do Haddad e outras lideranças da América Latina. Mas as demonstrações de demência não pararam por aí.

A lista de generais com nível cognitivo inferior ao aceitável parece interminável. Não bastassem os problemas corriqueiros, 2020 trouxe uma pandemia, que serviu para escancarar a total incompetência dos militares como gestores, com o agravante de não aceitarem que vozes mais ajuizadas tomassem corpo. Se alguém poderia achar que Bolsonaro seria uma exceção, seu conjunto de ministros é digno de perfilar entre muares e passar despercebido. 

No que diz respeito ao Ministro da Saúde, General Pazuello, sobram exemplos de notória ignorância e burrice. Fica latente que, mesmo após meses na pasta, não consegue entender sequer o caráter do SUS e que uma instituição pública não pode ser usada como instrumento para externar concepções ideológicas sobre temas estritamente científicos, muito menos agir com base em crenças negacionistas, que colocam a população à mercê da loucura e incompetência.

Depois de quase 35 anos livres da demência que as Forças Armadas se especializaram em formar, estamos subordinados aos devaneios de um grupo de adestrados, que acreditam que o tom de voz utilizado e termos como positivo e operante são suficientes para opinarem e decidirem sobre tudo. 

Para quem ainda consegue ver alguma virtude nesse grupo de gestores desqualificados, só resta acreditar que seja um caso de projeção. Onde só lhes parece “bonito, aquilo que é espelho”. Talvez seja esse o segredo da existência de um número significativo de seguidores. Fica evidente que não se pode esperar dos militares brasileiros honestidade e excelência. O que sobra é demência e uma dose exagerada de falta de humanidade.

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